BARLAVENTO (2020-ongoing) (PT)

Neste território insular algo aconteceu.

Algumas perguntas, no entanto, circundam esta experiência: como certos lugares podem ativar memórias tão familiares como se lá tivéssemos vivido? Como se expressam os conhecimentos e o tempo para corpos que habitam o legado das travessias diaspóricas, uma vez que as lacunas e os apagamentos nos constituem? Como objetos, lugares e sutilezas cotidianas podem ativar essa prática inscrita no corpo?

Fortemente interessado por estas questões - formuladas após meu primeiro encontro com as ilhas do território Cabo Verdiano - Barlavento se constitui como um projeto imersivo fotográfico em que tento lidar com a dualidade visual de encontrar vizinhanças entre o vivido e o familiar, o deslocamento e o pertencimento, o distante e o conhecido.

Através de um diagrama fotográfico em construção desde 2020, a série tensiona os limites da experiência e da herança memorial presente nas relações e objetos na tentativa de uma tradução visual para aquilo que não pode ser explicado verbalmente, não pela ausência de palavras, mas pela necessidade de encontrarmos um regime de comunicação que abarque suas intensidades, sensações e condições: a experiência do estranho familiar.

Como num quebra cabeça, as experiências fotográficas desse projeto funcionam como portais. Carregando em si espaços oníricos, cotidianos, mas, sobretudo, intensivos, capazes de nos religar em diferentes tempos a nossas próprias histórias e narrativas.

Ainda habitando o nível das perguntas, Barlavento é um projeto em desenvolvimento que articula através de um exercício de ficção especulativa as possibilidades de encontro entre memória, família e história desde uma perspectiva diaspórica, ou seja, uma experiência que é em si especulativa e ficcional. O ato de fotografar é, nesse caso, menos uma produção da imagem do outro mas uma resposta a essa reação. Uma composição onde a fotografia é também um bloco de notas de uma narrativa viva. Uma possibilidade de abertura em nossas maneiras de sentir e agir.

A travessia e o deslocamento como revelação do mistério: a paisagem.

BARLAVENTO (2020-ongoing) (EN)

Something happened in this insular land.

However, some questions around this experience hover: how is it that a place can activate memories that seem so real it is as if we had lived there? How can the knowledge and temporal legacy of the diaspora, given its inherent lacunae and erasures, be expressed? How is it that everyday objects, places and subtleties can activate this practice inscribed in the body?

Intrigued by such questions - which arose when I first visited the Cape Verde islands, I try in the immersive photographic project Barlavento to embrace the visual duality of finding commonalities between lived experience and the commonplace, between displacement and belonging, and between the distant and the familiar.

Through an ongoing photographic diagram begun in 2020, this series tests the limits of unconscious experience in an attempt to translate into a visual form something that cannot be explained verbally, not because of an absence of words, but because of the need to find a way of communicating that encompasses all the intensities, sensations and conditions of feeling a sense of familiarity with something unfamiliar.

Much like a jigsaw puzzle, I see these photographic experiences as portals that hold within them spaces that are dreamlike, commonplace, and - above all - intense, and that can reconnect us with times that differ from our own stories and narratives. What is it that the experience of wonder in a dream lived in reality can tell us / contribute?

While still in the realm of questioning, Barlavento is a project in development that is articulated through an experiment of speculative fiction on the possibility of bringing together memory, family and history. Here, the act of photographing is less about image production, and more about a response to this reaction. A composition in which photography is also a notebook for a living narrative. An opportunity for openness in ways of feeling and acting.

Crossing and displacement as a revelation of the mystery: the landscape.